O barulho do sol, ao se pôr no Pacífico....



quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

A Arte e a Vidência

Continuamos a ler os Gregos. E suas palavras, ainda que falam de reis e rainhas, monstros e heroís, ainda dizem muito sobre quem somos nós. Continuamos a olhar o teto da Capela Sistina e nos questionar. O profundo sentimento dos quadros do Munch não passa branco nem ao mais descompassado coração.

O que há na Arte que permite a sua persistência através dos tempos... A perfeição técnica? A qualidade estética? Mas a excelência da execuçao e o que é belo mudam com o avanço da tecnologia e a modificação das culturas.

Poderíamos ler Benjamin e Adorno e tecer longas considerações. Mas para mim, a resposta sempre foi muito simples. Há coisas inerentes ao humano que não conseguimos nos desvencilar. O nascer e o morrer. O desconhecido. Os sentimentos. A raiva, o amor. E  há uma sensação de pertencimento, quando somos remetidos a esses temas.

Sim. Há coisas que mudam o como e quando, mas nunca o porquê.

Pois bem, procurando uma poesia da Martha Medeiros que ia ser tema do post, mas me deparei com um Drummond. Meu eterno Drummond. E lendo, me veio a sensação de que o poema fora escrito ontem, para alguém que estava ao meu lado.... Ou talvez no prelúdio do 11 de setembro.

Enfim, deixo-a aqui, para que cada um possa ter seus próprios pensmentos. Muito mais complexos que essas parcas palavras de blog.

Elegia 1938

Trabalhas sem alegria para um mundo caduco,
onde as formas e as ações no encerram nenhum exemplo.
Praticas laboriosamente os gestos universais,
sentes calor e frio, falta de dinheiro, fome e desejo sexual.
Heróis enchem os parques da cidade em que te arrastas,
e preconizam a virtude, a renúncia, o sangue-frio, a concepção.
À noite, se neblina, abrem guarda-chuvas de bronze
ou se recolhem aos volumes de sinistras bibliotecas.
Amas a noite pelo poder de aniquilamento que encerra
e sabes que, dormindo, os problemas de dispensam de morrer.
Mas o terrível despertar prova a existência da Grande Máquina
e te repõe, pequenino, em face de indecifráveis palmeiras.
Caminhas entre mortos e com eles conversas
sobre coisas do tempo futuro e negócios do espírito.
A literatura estragou tuas melhores horas de amor.
Ao telefone perdeste muito, muitíssimo tempo de semear.
Coração orgulhoso, tens pressa de confessar tua derrota
e adiar para outro século a felicidade coletiva.
Aceitas a chuva, a guerra, o desemprego e a injusta distribuição
porque não podes, sozinho, dinamitar a ilha de Manhattan.

Carlos Drummond de Andrade

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